sábado, 4 de abril de 2009

“O Martírio de Joana D’Arc” por Henrique Vieira



Oitenta e dois minutos se passam entre a apresentação do personagem de Maria Falconetti e sua morte, que dá fim ao filme. Oitenta e dois minutos de silêncio absoluto, do qual nem nos lembramos tanto ao final. O mais impressionante é a escolha da fotografia – praticamente sempre em close-up nos personagens- e o desenrolar das cenas, constituídas de longos diálogos que dão, a um filme da era muda – 1928, um curioso traço moderno.


Balázs, em seu livro “Nós Estamos no Filme”, enaltece a importância do close-up no cinema. Diz ele que é pelo close-up que o cineasta direciona a atenção do espectador para o que ele quer, na hora que ele quer, e que é desta forma que se estabelece comunicação entre cineasta/espectador. É por este recurso que a mensagem fílmica se faz subjetiva, e por extensão: humana. Estas condições são básicas para se encarar o cinema como manifestação artística. Balázs fala ainda da força que tem o close-up do rosto humano. Nada mais expressivo que a fisionomia humana! Pelos detalhes de cada movimentação muscular da face, pelo menor índice de arqueamento da sobrancelha..., abre-se um universo de combinações significantes que falam por si só, independentes das referências espacial ou temporal nas quais o personagem esteja inserido.


É por esta vertente que “O Martírio de Joana D’Arc” se faz tão poderoso. O filme é basicamente todo constituído pelos diálogos entre Joana D’Arc e seus acusadores e filmado de forma íntima: em close-ups. E é intimamente que a obra se comunica com seus espectadores. Acompanhamos, do início ao fim, o rosto angustiado de uma Joana D’Arc insegura, temerosa, que se questiona, que se defende... As legendas do filme são necessárias para se entender o conteúdo da discussão mas nunca traduziriam o peso das emoções vividas pela personagem. Do mesmo jeito, não se sentiria a postura cínica e destruidora dos acusadores apenas pelas legendas. A imagem se faz condição sine qua non para que a história possa ser contada, e com toda carga emotiva – humana – que o diretor quis empregar nela.


Outro recurso desse filme, é a permanência insistente do close-up. Afinal, poderia-se utilizá-lo de forma abundante mas não necessariamente exclusiva. No entanto, conta-se nas mãos a quantidade de vezes que se sai de um registro fotográfico fechado. O resultado disso é uma sensação angustiante de aprisionamento, em referência à própria condição da protagonista diante de seu destino.


“O Martírio de Joana D’Arc”, apesar de ter sido feito em 1928, mudo e preto e branco, se faz impressionantemente moderno em sua forma de abordar os personagens e as emoções humanas e antevê, com décadas de avanço, um estilo de filme que irá muito se repetir.

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