segunda-feira, 8 de junho de 2009
"Palavras ao vento de um dramalhão norte-americano" por Tiago Bacelar
Nos primeiros 20 anos do século XX, ainda na era dos filmes mudos, o cinema hollywoodiano viu nasceu um gênero chamado melodrama, o qual inicialmente se baseava no teatro popular e do vaudeville norte-americano (museus baratos, literatura burlesca, cantores populares e circos de horror). Após a Segunda Guerra Mundial, o melodrama transforma-se num drama meloso, inspirado na interpretação do clown, exagerada e antinatural.
O cinema melodramático busca trazer fáceis apelos dramáticos ligados a certo fundo musical, que leve o espectador ao choro ou ao suspense, despertando nele um sentimentalismo exagerado. O melodrama é uma espécie de antecessor das chorosas produções novelescas mexicanas. É nesse contexto que entra o especialista do gênero, o alemão Douglas Sirk. Sua produção audiovisual mais conhecida foi “Palavras ao Vento (Written on the Wind)”.
O filme, produzido em 1956, foi roteirizado por George Zuckerman, que se baseou no livro de Robert Wilder. Zuckerman fez diversas alterações em relação à obra original, tais como: o local da trama passou da Carolina do Norte para o Texas, o tabaco foi substituído pelo petróleo e diversos personagens tiveram seus nomes alterados. A fotografia de Russel Metty reflete bem os anos 50 nos Estados Unidos, com muitas influências no figurino a lá Rock, nos penteados a lá Elvis Presley e John Travolta, nos adereços femininos, nos cenários e nos carros de cores exageradas da era consumista e industrial norte-americana.
O filme “Palavras ao Vento” traz a tona o velho clichê dos amigos de infância, que após se tornarem adultos, foram tomados por sentimentos de ciúme doentio, paixão sem limites, cobiça e inveja. É mais uma experiência com os pecados capitais. Dorothy Malone (Marylee Hadley), que ganhou merecidamente o Oscar como Melhor Atriz Coadjuvante, interpreta uma personagem que representa um sentimento feminino dos anos 50 de igualdade em relação ao homem, principalmente no aspecto da conquista de uma paixão.
Podemos colocar Marylee como uma Engraçadinha, de Nelson Rodrigues, ou uma Anita, de Manoel Carlos, daquela época. É impagável a seqüência em que revela sua ninfomania, numa montagem paralela, em que dança alucinadamente, no momento da morte do pai.
Rock Hudson (Mitch Wayne), que trabalhou em oito filmes com Douglas Sirk, representa em “Palavras ao Vento” a típica rebeldia juvenil norte-americana dos anos 50, com um topete a lá John Travolta, em Embalos de Sábado à noite, ou Elvis Presley. É um jovem, disposto a socar até o “irmão” pela mulher amada, crente ser um altar de moralidade.
Lauren Bacall (Lucy Moore Hadley), em atuação medíocre no filme, interpreta o típico e batido clichê da ambição feminina em deixar de ser uma assalariada para se casar com um milionário. Depois se apaixona por Hudson, e o clichê do happy end é colocado em cena por Douglas Sirk de uma forma ambígua, em que se tratando de destino, nada é garantido.
Robert Stack (Kyle Hadley) incorpora o espírito do vilão “ciumento”, gerado pela inveja que nutre desde a infância por nunca ter o respeito do pai, da irmã e da própria sociedade. Ele é um personagem originário da tragédia grega, sublime, grotesco e hilário. Depois do sucesso de “Palavras ao Vento”, o trio Dorothy Malone - Rock Hudson - Robert Stack apareceram juntos novamente pelas mãos de Douglas Sirk, em Almas Maculadas, de 1958.
Sirk traz em seu melodrama uma verdadeira tragédia grega de ousadia. O filme começa pelo fim, esbofeteando o espectador, numa seqüência com vento forte, folhas voando e música genial de Victor Young, interpretada pelo grupo The Four Aces. A produção “Palavras ao Vento” vale a pena ser vista por suas cores exageradas, pelos rios de lágrimas derramados, pela poesia e seriedade de Sirk e pelas palavras implícitas repletas de segundas intenções.
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