domingo, 17 de abril de 2011

"O Gabinete de Dr. Caligari", por Maria Gabriela de Miranda Costa.


Na Alemanha derrotada do pós-guerra, as artes plásticas expressionistas, que evocam uma crise subjetiva e social, irão provocar um impacto visual no cinema. Isso acontece não só pela sensibilidade de seus realizadores, mas também pela necessidade de alcançar os mercados externos com novas experiências de maior nível artístico.

Nesse contexto, “O gabinete do Dr. Caligari”, de Robert Wiene, reúne características que atingem a proposta expressionista inovadora de representar visualmente crises emocionais. Tanto que criou-se o termo “caligarismo” para denominar a impressão de uma pintura expressionista estar se movimentando. Isso se deve à ênfase dada a composição, através dos contrastes de luz e sombra, dos ângulos irregulares e, principalmente, da cenografia feita de painéis pintados ao estilo do movimento artístico em questão e com quase nenhuma profundidade. Esse cenário, que foge do realismo, demonstra um universo de pesadelo e é o responsável pela atmosfera misteriosa que lhe deu destaque.

Além disso, a interpretação dos atores, exagerada e de movimentos grandiosos, acompanhada da deformidade de maquiagens carregadas, atendia ao objetivo do diretor de evitar o uso de letreiros narrativos ou de inseri-los na narrativa visual. O que, inclusive, foi experiência importante do cinema expressionista.

O principal responsável pela estética marcante de “O gabinete do Dr. Caligari” foi o próprio diretor, Robert Wiene, o qual fez alterações significativas no roteiro original de Hans Janowitz e Carl Mayer. Dentre elas, a opção por rodar todo o filme em estúdio, e não em locações, e o uso do desenho estilizado, a fim de chegar à aparência expressionista desejada. No entanto, as alterações feitas na dramaturgia inverteram por completo a ideia central do roteiro. Quando, ao final, o espectador percebe que a história de perversidade é, na verdade, um delírio do protagonista Francis (Friedrich Feher), que aparece internado num hospício, a crítica à violência de qualquer autoridade social, presente na arte expressionista de um modo geral, é atenuada.

De certo modo, essa modificação substancial do roteiro não interferiu no sucesso mundial do filme. Caligari foi um verdadeiro 'abre-alas' para a indústria cinematográfica alemã, que exerceu fascínio sobre público e críticos e influenciou muitas outras obras em sua época, como “Golem” de Paul Wegener, “Nosferatu” de Murnau e “Dr. Mabuse” de Fritz Lang. Nos anos 40, ainda era possível ver os contrastes expressionistas em “Cidadão Kane” de Orson Welles. E atualmente, o principal representante dessa temática do sombrio é o diretor estadunidense Tim Burton.

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