domingo, 7 de junho de 2009

"Minha bela dama" por Yanna Luz


Rebento de 1964, My Fair Lady, de George Cukor, tornou-se, juntamente com os populares ‘A Noviça Rebelde’ e ‘Mary Poppins’, um dos filmes mais rentáveis da década de sessenta, época em que o cinema hollywoodiano estava em certo declínio – e que produziu muitos musicais famosos.

Hoje um clássico do cinema mundial, “Minha Bela Dama” (título em português) traz um enredo que nos faz ensaiar sensações de déjà vu (com algumas variações poderíamos esta falando da história da Gata Borralheira ou mesmo de Betty, a feia – com o perdão da comparação): apresenta a nem tão surpreendente, porém incansável, história da transformação de uma mulher, dessa vez Eliza Doolittle.

Eliza protagoniza tal metamorfose com a ajuda e esforço de Henri Higgins, culto e petulante professor de fonética, que havia apostado com seu amigo, Coronel Pickering, que conseguiria transformá-la de uma ignorante e arisca vendedora de flores a uma bela dama capaz de freqüentar os salões da mais alta sociedade londrina do início do século vinte. (E tal método deveria durar no máximo seis meses). Acompanhar tal processo, transposto em quase três horas de filme (!), poderia ser maçante. Faz-se, no entanto, surpreendentemente agradável. Delicadamente bem-humorado.

Por veicular uma estória não muito inovadora, o filme traz alguns personagens também caricatos que se tornam, porém, peculiares, devido às boas atuações e sensível seleção de elenco.

Desde Rex Harrison, que interpretou o carrancudo Higgins (e por esse faturou um Oscar de melhor ator) até Mona Washbourne, que deu vida à Sra Pearce, a governanta, temos grandes – e bem articuladas – contribuições dramáticas. Contudo, para protagonizar o filme não haveria contornos mais representativos senão os de Audrey Hepburn, sinônimo de beleza, elegância e graciosidade, em qualquer época. Sem dúvida, o brilho fundamental para que “My Fair Lady” adquirisse uma aura de sonho de menina.

E se os personagens demonstram a sincronia e a interação de um balé, há fatores fundamentais para ritmá-los: os enquadramentos mais distanciados (majoritariamente planos médios) – que não nos deixam esquecer inevitável raiz teatral - proporcionam liberdade de movimentos e a discrição necessária para que a trama seja levada adiante sem maiores tensões, além de reafirmar a musicalidade intrínseca. As coreografias estão imunes à intoxicação do exagero: são simples, porém expressivas. Trazem movimentos cabíveis na realidade diegética, com marcações que não se convertem em falsas ou inorgânicas ao término das canções, (raridade entre os exemplares do gênero).

Afora isto, há ainda outro ponto de graça fundamental, responsável direta pelo embalo dos personagens (e espectadores!): As músicas são sutis, saltitantes, sapateantes. Daquelas que podem ser flagradas na ponta de nossas línguas enquanto procuramos na geladeira algo para comer. Do tipo que ajudam a nos despirmos da realidade cotidiana embaixo d’água assim que passam a compor nosso novo repertório do chuveiro para dias de bom humor, por mais que não confessemos sem tortura.

E também: não por obra do acaso, o filme possui inspirações elegantemente florais. Inicialmente podemos notá-las de forma tímida, apenas nos ambientes de trabalho da protagonista (vendedora de flores), porém, ao passo que a mesma vai sendo refinada, tal tema permeia de forma constante cenário e figurino, invadindo desde as texturas dos papéis de parede até as cores e formatos das roupas e chapéus.

O filme faz-se, por tudo, agradável, doce, aveludado. Presenteia a quem assiste com momentos sutis, respeita qualquer cansaço, nos dá uma ótima chance de escapar do cotidiano e a –imperdível e modificante- oportunidade de acrescentar à nossa vida algum romantismo (que por ventura tenha se perdido), provando que embora alguns achem que vivem bem sem, ele pode ser o tempero que às vezes falta. E quando chega ao desfecho, ainda nos convence a novamente acreditar que mesmo parecendo impossível, de um rigoroso inverno é possível chegar, enfim, à primavera.

4 comentários:

  1. Achei esse texto tão diferente do teu estilo, Yanna!

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  2. Mas é que sabe o que eu acho que acontece? eu acho que eu meio que pego o clima do filme. Tipo, a primeira veio bem "intensa", reflexiva, a segunda meio rápida demais e pouco abrangente, e nessa eu acabei tentando falar de tudo um pouco, sei lá. Eu fui tão romântica nesse texto, que eu até estranho, mas é que o filme meio que despertou isso, eu acho. Curiosamente, trabalhei mais nessa do que nas outras... Sei lá, acho que não tenho um estilo próprio, Ângela. :/

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  3. Mas fora isso (!) não acho tão diferente assim :~

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  4. sim, entendi isso do clima do filme...
    e gostei muito, por sinal. acho que isso é muito bom!

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